Entrada

Depois de atender aquele cliente, fui para casa. Ainda queria aproveitar para descansar um bocadinho e comer qualquer coisa. Hoje apetecia-me sair, precisava de me afastar de tudo durante um bocadinho, precisava de afastar a minha cabeça de todas as preocupações e problemas. Parei em frente do espelho, olhando para a minha roupa, depois de ter tomado banho e de me ter vestido, e passei as mãos pelo meu vestido. Era preto, mas tinha brilhos, o que o tornava mais chamativo e mais sexy, claro. Fui até à casa de banho, secando o cabelo e alisando-o e coloquei a minha maquilhagem, calçando depois os sapatos por fim. Depois do dia de hoje, depois de ter de aturar o que tive de aturar, uma noite divertida era tudo o que precisava. Borrifei um pouco de perfume, antes de sair e depois sim, peguei na minha mala, indo embora.

Assim que cheguei à rua onde estava o meu prédio, atrevi-me a olhar para trás pela primeira vez. Ainda estava à espera de o ver aparecer do nada, ou então de carro, mas isso não aconteceu. Claro que não, ele nem sequer sabia onde eu vivia, e além do mais, eu tinha sido mais rápida. Sorri vitoriosa, abrindo a porta e subi pelo elevador até casa. Agora sim, ia finalmente descobrir o que tinha aquela mala de tão importante.

Voltei a pegar nos binóculos quando ela voltou para dentro sorrindo por ter pegado na mala. Ia sair de casa, podia ser esta a minha chance. Deixei os binóculos ali, não podia segurar duas coisas ao mesmo tempo para o que queria fazer e desci as escadas do sitio onde estava. Encostei-me à parede à espera que ela saísse e quando o fez eu puxei-a pelos braços agarrando os dois só com uma mão encostando a minha faca ao seu pescoço.
-Eu quero o meu dinheiro novata.

Estava distraída a tentar engendrar algum plano, quando de repente senti alguém agarrar-me com bastante brusquidão. Agora eu percebia porque me avisavam que bastava um pequeno segundo de distração para ir tudo por água abaixo.
- Mas que...- nem terminei de falar, porque rapidamente senti uma coisa fria junto ao meu pescoço a mal ouvi a voz, percebi logo quem era.- larga-me! - gritei-lhe, tentando debater-me. Eu não conseguia acreditar, eu ia matá-lo, ia matá-lo de forma muito dolorosa. Cerrei o maxilar assim que me pediu pelo dinheiro e acabei por parar de me mexer antes que me cortasse.- nem morta.- grunhi.

Não havia muito espaço de manobra porque se a largasse ela ia conseguir defender-se e isto ia correr mal. Gargalhei ironicamente por não me querer dar o dinheiro e virei-a na direcção do meu carro sempre com a lâmina encostada ao seu pescoço - tu começaste isto - culpei substituindo a lâmina por um pano para a adormecer e leva-la mais descansado no meu carro.

- Eu já te disse para me largares! - gritei, mas depois calei-me porque quanto mais alto falava, maior era a pressão da faca no meu pescoço. Engoli em seco e ele começou a encaminhar-me para o carro.- pára! - voltei a gritar. Tentei fazer força com os pés, para ele não me conseguir mover, mas não valia de nada- tu vais pagar tão pago por isto! - gritei.- larga..-e já não fui a tempo de fazer mais nada, porque mesmo que eu mexesse a cabeça, ele conseguiu encostar um pano à minha cara e desmaiei.

Resisti à sua força, que não era muita, até ela desfalecer nos meus braços e ainda a tapar-lhe a cara levei-a para o banco do pendura. Coloquei-lhe o cinto e fui para o banco do condutor saindo dali num piscar de olhos. Eu sabia que ela não era das faceis, pelo menos do que já tinha conhecido, mas também não ia ser tão dificil como se fosse um braço direito, como o meu pai era.
Em cinco minutos estava em casa pedindo aos seguranças para a levar até à casa que ficava do outro lado da minha.

encerrado

---duas semanas depois---
Os meus adesivos estavam a perder o efeito e já andava a mancar de novo, mas não era nada de especial como tinha acontecido naquele dia na praia. Olhei para a porta de casa de Zoey, sem querer acreditar naquilo que estava a fazer mas qualquer zanga que eu tivesse com ele, não superava aquilo que eu tinha ouvido. Toquei à campainha como sinal de paz, porque podia facilmente entrar-lhe pela casa à dentro.

Já tinham passado duas semanas desde que me tinha encontrado com Tyler na praia e, felizmente, este nunca mais tinha dado sinal de vida. Se calhar as minhas prezes tinham sido ouvidas e ele tinha mesmo morrido. Pousei a tigela da água de Bullet junto das tigelas da comida e passei a mão pelo pelo do mesmo, que felizmente já estava praticamente bom do que lhe tinha acontecido. Dei-lhe um beijinho no focinho, endireitando-me e foi nesse momento que ouvi o som da campainha soar. Fiz uma careta, olhando para a porta e aproximei-me da mesma, espreitando pelo binóculo da porta. Pronto, se calhar as minhas prezes não tinham sido ouvidas. Revirei os olhos, tentando perceber o porquê de ele estar ali e abri a porta, olhando-o.
- O que é que estás aqui a fazer?

Assim que Zoey abriu a porta, eu decidi começar já a falar antes que ela a voltasse a fechar-ma na cara. - Eles querem matar-nos a todos - disse com uma voz meio ofegante por causa de uma dor que tinha no peito, no sítio do tiro e por ter vindo quase a correr, e pus uma mão na porta para que ela não a fechasse - o meu pai e o... teu verdadeiro boss - ri-me sem vontade - sim, porque é óbvio que o boss não se ia mostrar a vocês. - tentei falar o mais rápido possível, mas as coisas começavam a ficar confusas na cabeça e eu sentia que podia cair para o lado a qualquer momento - deixa-me entrar. - pedi quase em tom de suplica.

Mesmo antes de ele começar a falar, já eu me estava a preparar para lhe fechar a porta na cara, preparando-me também para lhe dizer que não queria ouvir nada do que ele tivesse para me dizer. Mas, contrariamente ao que eu pensava que ele vinha ali fazer, as coisas que ele me começou a dizer fizeram com que eu mantivesse a porta aberta enquanto o ouvia falar. Arregalei os olhos, com as coisas que ele dizia, e ainda tentei interrompê-lo, para lhe perguntar se ele tinha a certeza do que me estava a dizer, mas estava tão em choque que nem isso consegui fazer. Abanei a cabeça, tentando raciocinar o que estava a acontecer. Queriam matar-nos? O seu pai e um suposto Boss que eu nem conhecia? Como é que isto era possível. Senti-me despertar dos meus pensamentos quando ele me pediu que o deixasse entrar e, face ao seu estado e a tudo o que estava a acontecer, eu acenei, abrindo mais a porta para que entrasse.
- Eu não estou a perceber o que se passa.- murmurei, abanando a cabeça, ainda em choque.- porque é que nos querem matar? Explica-me, por favor. - olhei-o.- porque é que o teu pai te quer matar? - quer dizer, eu a mim ainda percebia mas a ele, era o seu filho, como é que era possível?

Fiquei mais aliviado quando ela me deixou entrar e fui aos tropeções sentar-me no seu sofá vendo o cão dela passar por lá e vir ter comigo. Ele gostava mesmo de mim, até tinha pena de o ter magoado, mesmo que tinha sido sem querer. Olhei para Zoey e abanei a cabeça. 
-Uma coisa que não sei se sabes, é que o boss nunca dá a cara, ele escolhe o braço direito para fazer isso tudo. E adivinha, o meu pai é o braço direito e é um corrupto de merda - ri-me - ele é um autentico psicopata, nunca iria ter pena de me matar. Era por isso que protegia a minha mãe, mas ela está morta, por isso... - respirei fundo para não me dar um ataquezinho ali - eles estão a planear um massacre. Nós temos que falar com alguém. Podemos deixar o nosso ódio de lado por umas semanas?

Fechei a porta logo depois de Tyler ter entrado e ainda fiquei de frente para a mesma enquanto tentava perceber se tudo aquilo estava mesmo a acontecer. Abanei a cabeça, rodando sobre o meu próprio corpo e fui até à sala, vendo-o já sentado no sofá. Pela sua cara devia estar com dores, mas nem nisso eu conseguia pensar agora. Sentei-me ao seu lado, ficando a ouvi-lo falar e quantas mais coisas ele dizia, mais o meu coração batia de forma descontrolada. Um massacre? Queriam matar-nos aos dois? O seu pai era o braço direito do seu boss? Isto eram demasiadas coisas para assimilar. Levei as mãos à cara, respirando fundo e fechei os olhos enquanto tentava não ter um ataque de pânico ali mesmo. Precisava de ser racional, precisava de pensar em alguma coisa. Levantei a cabeça assim que ouvi a sua pergunta e, por muita vontade que tivesse de lhe dizer um não, acabei por assentir.
- Não me parece que tenhamos outro remédio.- murmurei.- por muito que te odeio, quero continuar a viver e não me parece que o consiga se estiver de costas voltadas contigo.

Não fiquei surpreendido quando ela disse que não tinha outro remédio que não aceitar uma aliança. Era óbvio que ela queria aceitar, se o que ela queria era sobreviver. Estava era admirado por ter acredito em mim. Agarrei-me ao meu peito - por acaso não tens um comprimido para as dores ou assim? - perguntei. Agora que já lhe tinha dito tudo podia ir embora, mas duvidava que conseguia conduzir agora. - eu vou embora depois de o ter. - olhei para o cão que veio para cima das minhas pernas.

Deixei-me cair para trás, recostando-me no sofá e em silêncio, revi mentalmente toda a nossa conversa, sentindo-me encurralada. Já não bastava o facto de ter perdido todos aqueles que faziam parte do meu gangue, ter ficado sozinha para agora, além disso, estar sob a ameaça de morte do pai do meu suposto inimigo, onde é que isto cabia na cabeça de alguém. Abanei a cabeça, engolindo em seco, para tentar dissolver o nó que tinha na garganta, e olhei para Tyler assim que ouvi a sua pergunta.
- Eu vou arranjar-te qualquer coisa.- disse, levantando-me e encolhi os ombros.- podes ficar aqui até te sentires melhor, pelos vistos vou ter de me habituar à tua presença.- murmurei e afastei-me para ir à procura dos comprimidos.

Ri-me apesar de tudo o que menos me apetecia ser isso e assenti. 
-Podes ter a certeza que vais - disse. Encostei a minha cabeça a uma almofada, ficando meio torto, mas assim sentia-me bem. - Uma coisa que me arrependo - falei alto para ela ouvir - ter magoado o teu cão. Não era suposto - toquei-lhe na pata magoada muito ao de leve vendo-o remexer-se.

Fui até à minha casa de banho, vasculhando no pequeno armário que lá tinha, e assim que encontrei a caixa de analgésicos, passei pela cozinha para pegar num copo de água e voltei para a sala, ouvindo Tyler dizer que estava arrependido de ter magoado Bullet. Suspirei baixinho, olhando para o meu cão, que estava deitado com a cabeça no seu colo e aproximei-me dos dois, estendendo-lhe o copo e os comprimidos.
- Tirando a parte em que eu sei que aquele tiro era para mim..- revirei os olhos.- não me parece que ele esteja sequer chateado contigo.- disse, voltando a sentar-me.- aliás, ele tem uma espécie de adoração por ti que nem eu consigo compreender.

Sorri com a resposta dela e sentei-me direito no banco. Agarrei no copo e no analgésico, tomando o comprimido. 
-A bala não era para ti, era para a jarra que tinhas lá dentro - encolhi os ombros e olhei-a. - Eu só queria assustar-te. - disse com um sorriso e quando senti algo a mexer-se vi que era Bullet a deitar-se nas minhas pernas - ele ama-me mesmo - comentei e depois fiquei mais sério - o que é que queres fazer para ajudar as poucas pessoas que ainda restam dos bloods? - perguntei - e a ti mesma, claro. 

- E conseguiste.- disse num tom meio seco, quando Tyler disse que me queria assustar, mas acabei por me endireitar, tentando não voltar àquele assunto. Se era para colocarmos as nossas desavenças de parte durante este período conturbado, era melhor fazê-lo. Sorri levemente, ao ver o meu cão enroscar-se no seu colo e voltei a subir o olhar para o seu assim que ouvi a sua pergunta.- eu não sei.- respondi sinceramente, encolhendo os ombros.- eu nem sequer sei quem são as pessoas que ainda existem, se é que existem.- murmurei, olhando para as minhas mãos.- nem sei o que fazer, nunca estive nesta posição antes.- suspirei.- só me apetece fugir daqui para um sítio onde eles nunca me encontrem.

-Claro que há - disse com uma careta e levantei as sobrancelhas - és tão verde - comentei mas deixei o resto de lado, nem toda a gente tinha o privilegio de ser como eu desde criança. Os meus avós tinham-me criado bem e ensinado tudo para sobreviver. 
- Primeiro, temos que apagar qualquer rasto de ilegalidade que tenhamos. Claro que vão saber que fazemos parte de gangues, mas sem provas, ninguém nos incrimina - comecei a explicar-lhe - depois, temos que falar com a polícia e ela faz o resto - encolhi os ombros.

Revirei os olhos quando disse que eu era verde e cruzei os braços ao peito enquanto o olhava.
- Desculpa lá se não sou um veterano nisto tudo como tu.- resmunguei, mas acabei por me calar quando ele me começou a explicar o que tínhamos de fazer. Ouvi tudo com atenção, assentindo ao que me disse e abracei-me a uma das minhas almofadas, mordiscando a parte de dentro da minha bochecha.- nunca pensei precisar da ajuda da polícia.- desabafei encolhendo os ombros.- visto que passámos o tempo todo a fugir dela.- fiz uma careta e encostei a cabeça ao sofá.- eu só não quero morrer, por isso, vou fazer tudo o que me disseres para fazer.- olhei-o de novo.- espero bem que não me estejas a enganar porque eu estou a confiar em ti.

 -Se fosses um veterano nunca ias negar a minha oferta de proteção e de acesso aos crips. - disse-lhe - toda a gente sabe que os bloods são uma imitação rasca e que não ter amor aos deles - olhei-a - o meu pai também não tem pelo gangue dele, mas ele é uma exceção à regra. - encolhi os ombros - é meu pai - encostei-me melhor ao sofá. Fiz uma careta com o que ela disse - tu precisas de fugir dela? - perguntei. É claro que precisava de ter cuidado com a polícia, mas também sabia safar-me muito bem e era bastante convincente. Não disse mais nada sobre isso e olhei-a - não estou a enganar-te, preciso de ti viva. - sorri - daqui a alguns dias vai ser convocada uma reunião. - disse-lhe - eles vão saber que estou vivo, já que o meu pai é um traidor por isso tem cuidado com a tua língua ou ainda és morta. - avisei-a - tenta saber o máximo possível do novo "boss" que vai ser mandado e o resto é comigo.

- Vais mesmo obrigar-me a repetir o porquê de ter entrado para os Bloods? - perguntei, não deixando que respondesse.- eles foram os únicos que me ajudaram na altura, pode não ter sido a minha melhor escolha mas o que queres que faça agora? - olhei-o.- já é tarde demais para fazer seja o que for Tyler.- encolhi os ombros, passando ambas as mão pelo cabelo e depois calei-me, limitando-me apenas a assentir quando disse que não me estava a enganar. Eu esperava bem que não porque, de alguma forma que nem eu sabia, eu estava a confiar nele.- o que é que é suposto dizer em relação a ti? - perguntei.- para todos os efeitos, eles achavam que eu te tinha morto.

Ia dizer que ela não precisava que era para pararmos a conversa, mas ela nem me deixou falar.
-Eu não tenho nada a ver com isso, mesmo a saberes que não eram bons, não aceitaste o meu pedido - agarrei no comando da televisão que estava ao meu lado e liguei-a. Pretendia passar pelo menos ali mais uma hora até a minha cabeça parar de pensar tanto. - mas eles vão saber que estou vivo, ou melhor, o verdadeiro boss vai saber que estou vivo e vai dizer a alguém. Alguém vai avisar-te e tu precisas de fazer-te de desentendida e perguntar quem é que disse tal coisa.