Jardins

Eu não dizia que estava contente com aquela festa, mas se era tipicamente tradicional, não me opunha. O meu pai fez um sorriso enorme, assim que me viu pronta. Estava simples e elegante. Os meus irmãos tinham-se adiantado. Havia um homem de bom porte à minha espera. Georgini ou algo assim. Entrei no carro com ele e seguimos até ao local da festa. Seria num dos jardins mais bonitos de Roma. Estava exclusivamente reservado para aquela festa.

Limitei-me a chegar o sitio da festa. Guiuliana era a minha acompanhante e estava vestida ao meu nivel. Depois daquela noite juntos, outras tinham-se seguida, mas apenas quando eu me embebedava. Sóbrio nunca faria sexo com ela, nem com outra mulher que não Cel. Chegámos e fomos em recebidos. Eu estava de bastante mau humor e sem graça para aquilo e ia ficar pouco tempo para depois voltar para casa e estar com os meus filhos.

Felizmente, não havia apenas champanhe a circular pelos empregados e sim também vinho. Continuava a não gostar muito de beber. Aceitei um copo de vinho e rondei com o meu par por ali. Aos poucos o jardim começou a encher e uma música ambiente fluiu. Eu estava distraída da conversa, que o Georgini tinha com alguns familiares. O meu olhar circulava pela sala.

Eu estava o convidado mais desinteressado possível. Todas as conversas que tinha eram vagas. A minha atenção recaía mais no whisky do que nas pessoas. Deambulei por ali, acho que Guiuliana andava atrás de mim, não queria saber. Passei pelos outros convidados até me cruzar com um tio afastado, um homem que odiava solenemente - Anthony - Cumprimentei friamente, apenas porque a educação mo exigia.

*Off*
O homem tinha esbarrado no seu pior inimigo. Enzo tinha-lhe estragado todos os negócios e planos sujos que tinha com o tio do mesmo. Todos os esforços de matar o pai do rapaz, agora homem feito, foram em vão. Mas agora exercia de um trunfo bem alto na manga. Quem diria que a sua própria filha bastarda tinha uma relação com Enzo? Era a sorte grande!
- Enzo.. - Cumprimentou-o, friamente. Apertaram as mãos. - Há quanto tempo! - sorriu. Ele estava a adorar cada minuto à sua frente. - Gostaria de lhe apresentar uma pessoa. - Anthony fez sinal aos seus homens e pouco depois, Celine caminhava até eles. Ela vinha implacável, bonita e segura de si mesma. Um sorriso malicioso brilhava nos seus lábios. E o seu olhar era tão frio e tão cruel. Aqueles dois meses tinham sido cruciais para a sua mudança. - Esta é a minha filha, Celine.

Anthony era talvez das pessoas mais desprezíveis à face da Terra. Um falhado que, por muito que tentasse, nunca ia ser ninguém de poder. Nunca.
E então, como se o mundo tivesse decidido dar-me uma facada, lá vinha ela. Linda como sempre, mas diferente. Anda assim era ela, Celine. A minha boca abriu-se de espanto e por momentos nem liguei ao facto de Anthony a anunciar com sua filha. Ela estava viva! Viva, bem, e à minha frente! - Cel... - A minha voz traiu-me, eu estava abalado e emocionado.

- Boa noite. - O meu olhar cruzou-se com o de Enzo. Senti um arrepio percorrer-me o corpo. Depois de tanto tempo, eu ainda me sentia atraída por ele. E o meu coração batia tão rápido, que quase jurei que me fosse saltar do peito. No entanto não me podia esquecer daquilo que ele fizera ao meu pai. Era imperdoável. - É Celine, não Cel.. - Ignorei o olhar de choque de Giuliana. Eu tinha aprendido a lidar com mulheres como ela.

Sim, era ela, pensei, mas não era a mesma. Percebi-o pelos seu olhar, pela sua voz, pela sua postura. Aquela não era a Cel que eu amava. Isso deixou-me na defensiva. Tomei controlo da minha voz e não voltei a deixar que as emoções levassem a melhor - Então este tempo todo estiveste ... - "bem" não seria a palavra indicada - por aqui. Podemos falar?

Levei o copo de vinho à boca. - Cinco minutos, apenas.. - o meu pai sorriu de forma maliciosa. Mesmo tendo passado aquele tempo com ele, de certa forma, ainda me assustava. Mandei um olhar furtivo a Giuliana e esta afastou-se rapidamente. Quando ficámos os dois, sozinhos, seguimos para as traseiras do jardim.

Não gostava de como ela estava agora. E agora é que me apercebia... Anthony, seu pai? Era uma desgraça ela ser filha de um cabrão como aquele. Indignado, mas sem o demonstrar, segui atrás dela. - Ele mantém-te prisioneira? - Perguntei porque era a única opção que me vinha à cabeça para ela ter ficado dois meses com aquele homem.

O meu olhar estava posto no horizonte. Não queria arriscar vacilar num momento como aquele. Molhei novamente a boca com o vinho. - Há quanto tempo estão juntos? - ignorei a sua pergunta. Eu queria perguntar pelos gémeos, mas os meus sentimentos, tinham falado mais alto.

Ela não respondera à minha pergunta. Eu não responderia à dela. Para além de que eu e Guiliana não estávamos juntos, a pergunta era absurda. - Pensei que estavas morta, raptada. Tenho andado à tua procura. - O meu olhar vacilou por momento - Estava desesperado.

- Pois eu estou viva e de perfeita saúde. podes deixar de procurar! - Virei-me para ele e sorri cinicamente. Talvez não fosse totalmente verdade. Eu tornara-me numa mulher infeliz, depois daquilo tudo. Afinal, eu passara dois meses trancada naquela casa. - Como estão os gémeos?

O tom dela atingiu-me bem forte. O que estava de errado com ela? Ela ainda não me respondera à pergunta que primeiro fizera e subitamente já não estava desolado pelo seu desaparecimento, estava furioso meses contive-me - Dois meses fora e não te importaste com eles. Mas respondendo à tua pergunta, estão bem, fora o facto de não terem a mãe por perto.

Por momentos senti-me tonta. As suas palavras tinham-me acertado em cheio. O meu coração ficara em migalhas. - Pensa o que quiseres.. - quase que murmurei. Eu não parara um minuto que fosse, de pensar nos nossos filhos.
A nossa conversa foi interrompida por Allegra quase aos gritos. Recebemos alguns olhares por parte dos convidados. - O que fazes aqui?! - ela parecia tão chocada quanto Giuliana.
- Prazer em revê-la também.. - sorri. - O seu sobrinho já sabe que pagou para me fazer desaparecer? Ups.. era segredo?! - cheguei-me à frente. - Numa coisa tenho que lhe agradecer.. pude finalmente conhecer o meu pai. - estalei a língua. A sua cara de horror era impagável.

A interrupção da tia Allegra foi tudo menos oportuna. Escutei a conversa e  não me escapou o que Celine disse. Fitei Allegra duramente. Aproximei-me e agarrei-a pelo braço. Depois disse num tom frio e cortante   Isto foi obra sua. Avisei-a que não se metesse no meu caminho - Fiz sinal a um dos meus homens que estava naquela festa - Sabes o que fazer - E empurrei a minha tia na sua direção. Depois virei-me para encarar Celine.

Eu não queria assistir àquele espectáculo todo. Preferia ficar longe. O meu olhar voltou a encontrar-se com o de Enzo. - Tem o resto de uma óptima noite, Enzo.. - segui em direcção ao meu pai, que me esperava sorridente.
- Bom trabalho. - ele sussurrou-me ao ouvido. - Hey, não fiques assim. Terás que andar com escutas, durante mais alguns dias. É pelo teu bem. - apenas lhe sorri e fui sentar-me na mesa indicada. O meu pai ausentou-se uns minutos.

Tinham tirado a noite para me lixar? Celine...Celine...Celine... Tinha que arranjar maneira de voltar a estar a sós com ela, de fazê-la ver que precisava dela e de a chamar à razão sobre o estupor do seu pai. E Allegra que neste momento estava tramada até ao pescoço, ia sofrer por tudo. Que merda. Fingi que não se passava nada e continuei na festa.

Eu tivera o azar de ficar na mesma mesa que Enzo e Giuliana. Ela não parava de se atirar a ele, sempre a agarrá-lo e com risinhos irritantes. Não demonstrei o quanto aquilo me incomodava, estava com ciúmes. Mas estava aborrecida e algo chateada. E por isso, dediquei-me exclusivamente ao vinho.
Tinha ficado durante dois meses presa numa casa, proibida de comunicar com os gémeos e a descobrir coisas sobre Enzo. Eu amava-o e odiava-o ao mesmo tempo.

Eu não prestava a minima atenção a ninguém. Ignorava Guiuliana e apenas de vez em quando olhava para Celine. Como podia ser dificil? O meu olhar acabou por repousar em Anthony. Ia matá-lo.

Para tentar distrair-me, acabei por alinhar na conversa que surgia pela mesa. O meu italiano fluía naturalmente, era praticamente perfeito. Anthony insistira imenso naquilo. De vez em quando o meu olhar cruzava-se com o de Enzo. Isso incomodava-me tanto.

Ela agora até falava italiano. Em dois meses ela arranjara tempo para tudo menos para mim. Menos para os gémeos. Mas que raios? Saí da mesa e fui disparado para o bar.

Eu quis ir atrás de Enzo, consolá-lo e contar-lhe tudo o que se passara naqueles meses, mas não podia. Quando o jantar acabou, Geogini chamou-me para dançar. O meu pai não descansou até que eu aceitasse. Por isso fiz-lhe a vontade e juntámos-nos aos outros casais. O rapaz era divertido, não parei de me rir. Devia ser ligeiramente mais novo que Enzo e quase apostava de como Anthony queria que ficássemos juntos.

A minha vontade era ir-me embora mas descobri que não conseguia. Muitas vezes procurei por Celine entre a multidão. Encontrei-a agarrada a um qualquer e a rir-se como não ria comigo. Fiquei furioso, parti um copo e tudo. Depois fui buscar Guiliana.